Estudo avalia letalidade hospitalar por COVID-19 em quatro capitais do Brasil e possível relação com variante Gama
Um estudo com dados mensais de 2020 e 2021, do Sistema de Informação da Vigilância Epidemiológica da Gripe (SIVEP-Gripe), em indivíduos com 20 anos de idade ou mais, investigou a letalidade hospitalar e em Unidade de Terapia Intensiva (UTI), da COVID-19, em quatro capitais brasileiras, em meses de picos epidêmicos e nos meses anteriores.
Desenvolvido pelos pesquisadores Jesem Orellana, do Instituto Leônidas & Maria Deane (ILMD / Fiocruz Amazônia), Lihsieh Marrero, da Universidade do Estado do Amazonas (UEA) e, Bernardo Lessa Horta, da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), o artigo “Letalidade hospitalar por COVID-19 em quatro capitais brasileiras e sua possível relação temporal com a variante Gama, 2020-2021” foi aceito para publicação, e em breve estará disponível na íntegra, na revista “Epidemiologia e Serviços de Saúde“, do Sistema Único de Saúde (SUS) do Brasil.
“O estudo mostrou que a letalidade hospitalar e em UTI caiu ou manteve-se estável nas quatro capitais, especialmente em Manaus e durante o pico epidêmico com predomínio da variante Gama, popularmente conhecida como P.1.”, explicou o epidemiologista Jesem Orellana.
Foram avaliados os registros de internações e óbitos de quatro metrópoles: Manaus (região norte); São Paulo (região sudeste); Curitiba (região sul); e Porto Alegre (região sul). Manaus foi incluída por ter sido a capital mais afetada pela epidemia, tanto na primeira (sem a variante Gama) como na segunda onda (com predomínio da variante Gama). Além disso, a pesquisa apresenta indicativos de que a variante Gama (P.1) se disseminou nessa capital de forma violenta, levando a novo e ainda mais severo colapso de sua rede médico-assistencial.
São Paulo, Curitiba e Porto Alegre, que segundo os pesquisadores, contam com uma das melhores redes de alta complexidade do país, incluindo expressiva disponibilidade de leitos de UTI, em relação a região norte, por exemplo, foram selecionadas como controle por terem experimentado queda ou estabilidade na incidência de SRAG em janeiro de 2021, em comparação com o mês de referência de 2020.
Este padrão de transmissão comunitária permitiu aos pesquisadores não apenas a avaliação da letalidade hospitalar, em cenário de modestos avanços na terapêutica e no manejo de casos clínicos de COVID-19, mas também diante de evidências de que a variante Gama não circulou de forma intensa nessas capitais, antes de fevereiro de 2021.
Em entrevista, Jesem explicou ainda que “o fato de a letalidade hospitalar e em UTI ter caído ou se mantido estável em janeiro de 2021 na cidade de Manaus, durante inédito e explosivo pico de contágios associados a variante Gama, enfraquece a hipótese de que a variante Gama seria mais letal do que as linhagens que circulavam previamente no Amazonas”.
Este é o primeiro estudo que descreve a letalidade hospitalar e em UTI da COVID-19, em cenários com e sem circulação da variante Gama (P.1). Os resultados sugerem que o colapso da rede médico-assistencial em Manaus pode ter determinado a elevação das taxas de mortalidade por COVID-19, possivelmente como consequência indireta da forte circulação da variante Gama (P.1), associada a maior transmissibilidade.
“Esse é um estudo que adiciona conhecimento sobre a história natural da doença e sugere que a variante Gama não é mais letal do que linhagens prévias. Portanto, estes resultados podem servir de estímulo para que outros sejam realizados, preferencialmente com dados clínicos e que considerem o agente etiológico ou a variante que acometeu esses pacientes, avançando na compreensão da doença e de suas principais características”, pontuou Orellana.
Os resultados do estudo contribuem para o desenvolvimento de políticas de contenção da epidemia. “Ademais, nossos resultados podem ser úteis para que tomadores de decisão considerem em suas políticas de contenção da epidemia, a elevada capacidade de disseminação da variante Gama no nível populacional. Este é um aspecto chave, já que variantes mais contagiosas aumentam rapidamente o número de doentes graves, fazendo com que redes médico-hospitalares fiquem saturadas, ou até mesmo alcancem graves colapsos, como o observado em janeiro de 2021, em Manaus”, enfatizou o epidemiologista.