Fiocruz Amazônia defende linhas de pesquisa em saúde, capacitação o combate à violência contra minorias étnicas como diferenciais de resistência nos 68 anos da Ensp
A diretora do Instituto Leônidas & Maria Deane (ILMD/Fiocruz Amazônia), Adele Schwartz Benzaken, defendeu o fortalecimento das linhas de pesquisa em saúde, a capacitação de populações rurais e indígenas e o combate à violência como diferenciais de resistência e o caminho a ser seguido em busca da superação dos desafios existentes na região amazônica, para garantir o direito à saúde sobretudo nos territórios indígenas. Benzaken foi uma das palestrantes da Roda de Conversa “Determinação socioambiental da saúde, conflitos, ameaças e resistência”, ocorrida na tarde desta quinta-feira, 8/09, em homenagens ao Dia da Amazônia, dentro das comemorações dos 68 anos da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp), da Fundação Oswaldo Cruz.
O Dia da Amazônia é comemorado anualmente em todo o território nacional no dia 5 de setembro, data estabelecida pela Lei 11.621, de 19 de dezembro de 2007. O objetivo da Roda de Conversa foi o de abordar os fatores que podem influenciar e contribuir para a retomada civilizatória e reconquista de direitos, tendo como marco a busca por uma sociedade mais sustentável, equânime, justa e democrática, além do resgate de agendas direcionadas à redução das desigualdades em saúde, ao combate à fome e à violência. Em sua apresentação, a diretora da Fiocruz Amazônia mostrou quais as contribuições que a produção do conhecimento em saúde coletiva pode dar, frente ao cenário de iniquidades sociais vigentes na Amazônia.
De acordo com a médica sanitarista, a Amazônia Legal possui a menor taxa de mestres e doutores do País. “Apesar do crescimento no número de Programas de Pós-Graduação na região, há uma disparidade na proporção de cursos de excelência (notas 6 e 7 pela CAPES), e é a região com a menor participação nos dispêndios em Ciência, Tecnologia e Inovação, em comparação às demais regiões brasileiras”, afirma. Neste sentido, a interiorização da pós-graduação tem caráter estratégico determinante, conforme a especialista. “A Fiocruz Amazônia tem um projeto estratégico sanitarista indígena que passará a oferecer ainda este ano programas de pós-graduação voltados para qualificar indígenas graduados em diversas áreas de conhecimento para atuar no campo da saúde coletiva”, afirmou.
Adele Benzaken destaca a importância das pesquisas desenvolvidas pela Fiocruz Amazônia no tocante às desigualdades sanitárias na Região Norte para possíveis intervenções. “Dados como o do restrito número de médicos atuando no Sistema Único de Saúde na região (1/1000 habitantes) e elevada razão capital/interior na disponibilidade desses profissionais (2,5 médicos/1000 habitantes nas capitais, contra 0,4/1000 no interior), além dos déficits históricos de saneamento básico, da rede de esgoto e da quantidade de unidades de saúde são alguns dos diagnósticos possibilitados”, exemplificou.
Na comparação entre regiões geográficas a disponibilidade de médicos nas capitais do Norte foi quase 3 vezes inferior àquela encontrada nas do Sul do país; (7,1/1000) e mais de 4 vezes inferior à distribuição de médicos no interior do Sudeste (1,7/1000). Dentre os estados do Norte, o Amazonas teve o menor percentual de médicos com registro de atuação no interior do estado (6,9%).
Os altos índices de violência também demonstram a incapacidade do poder público em enfrentar a criminalidade na região. Adele Benzaken ressaltou que na Amazônia Legal o volume dos homicídios duplicou (107,6% de aumento, passando de 3906 a 8110 entre 2000 e 2010), sendo cinco vezes maior de que o crescimento populacional (21,1%). A Amazônia Legal aumentou a sua taxa de homicídios por 100.000 habitantes em 71,5% entre 2000 e 2010. Para a Região Norte, Adele lembra que o quadro é ainda pior: o volume dos homicídios aumentou 132% entre 2000 e 2010 e a taxa de homicídios aumentou 88,6% com crescimento populacional de 23%. No mesmo período, acontece também uma tendência de interiorização da violência letal, atingindo um número progressivo de municípios e cada vez mais longe das grandes metrópoles estaduais; Nas regiões mais rurais da Amazônia, os homicídios parecem acompanhar as frentes pioneiras do desmatamento e da intensificação das atividades humanas (mineração, soja e pesca ilegal).
A médica aponta também como alternativas para superar as lacunas de cobertura na região ter unidades de saúde concentradas em sedes municipais, lutar por modelo de financiamento mais inclusivo que incorpore gastos operacionais elevados e permita ampliar os investimentos em infraestrutura: rede física, fixar profissionais no interior do estado, interiorizar políticas sociais e infraestrutura geral (rede elétrica, saneamento, rede viária/fluvial regular, internet, etc), avançar na resolutividade, gestão e organização do cuidado para populações rurais e indígenas e ampliar qualificar ações de vigilância nos sistemas municipais de saúde do interior, otimizando o uso da inteligência epidemiológica para a tomada de decisão e a compatibilização com as rotinas das UBS, pautadas pelos “programas de saúde”.
O pesquisador da ENSP Marcelo Firpo coordenou a palestra, que contou com a participação do também pesquisador da ENSP Paulo Basta; da antropóloga Beatriz Matos; e Jax Nildo, professor da Unifesspa.