Médico concilia interesses do conhecimento tradicional indígena com a medicina ocidental na área rural de Tabatinga

Conciliar os conhecimentos da medicina ocidental com os da medicina tradicional de populações indígenas e rurais da Amazônia pode parecer um desafio para profissionais de saúde, mas para o médico paulistano Everson Ubiali, há cerca de seis anos contratado da Secretaria Municipal de Saúde (Semsa), da Prefeitura de Tabatinga, para atuar na Saúde Indígena do município, é mais que uma rotina de trabalho. Ubiali faz do contato com as comunidades indígenas o canal de intercâmbio e fonte de informações. “Temos que respeitar a cultura das populações tradicionais. O conhecimento dos pajés, raizeiros e curandeiras é muito importante para nós. Trabalhamos juntos”, conta Ubiali.

O médico foi um dos participantes da oficina Educação Popular e Comunicação em Saúde para Engajamento Social e Fortalecimento da Cobertura Vacinal da População Ribeirinha, Quilombola e Migrante, oferecida na comunidade rural Novo Paraíso, no município de Tabatinga, dentro do Projeto Amazônia: Ciência, Saúde e Solidariedade no Enfrentamento à Covid-19, desenvolvido pela Fiocruz Amazônia e Fiotec, em parceria com a Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID), NPI EXPAND e SITAWI Finanças para o Bem. As oficinas vêm ocorrendo em diferentes territórios, voltadas para ribeirinhos, quilombolas e de migrantes.

Segundo Ubiali, o uso da medicina tradicional ajuda na construção de um bom relacionamento com as comunidades. “Todos eles utilizam ervas e procuram o doutor. Trabalhamos juntos para desmistificar a imagem de que só os médicos têm razão. Não fico me endeusando, procuro falar a linguagem que eles entendem, porque eu que tenho que me adequar à realidade deles. Nos nivelamos pela linguagem e quanto mais houver troca de saberes, maior a confiança no tratamento”, conta.

Nesse período em que se encontra na região do Alto Solimões, o profissional de saúde relata que já percebeu os efeitos positivos obtidos com esse modo de atuação, contribuindo no processo de cura e controle de algumas doenças, como o diabetes, por exemplo. “No começo, eram aproximadamente 80 atendimentos/mês e hoje esse número se reduziu à praticamente à metade”, observa. Ubiali trabalha tanto na área indígena quanto na rural. “Consigo conciliar bem as duas vivências, sei das dificuldades e não me importo em ter que dormir muitas vezes na comunidade. Respeito e concordo com eles, não os desmereço, mas receito o medicamento que eles possam tomar junto com o seu chá”, afirma.

Na saúde indígena, o acesso aos pajés, curandeiros e raizeiros é fundamental na assistência à saúde. “Todos que procuram o consultório médico passaram antes com os pajés. Eles recomendam as ervas e chás e pedem que o paciente procure o ‘doutor’. Para os médicos que pretendem trabalhar na região amazônica, essa é uma premissa básica”, aconselha. “Incentivo o trabalho conjunto, sobretudo quando há casos de doenças que agravam e precisam de um cuidado maior, para conseguirmos prestar essa assistência é imprescindível que trabalhemos juntos”, confirma.

Buscar a cura por meio da medicina tradicional é prática recorrente na comunidade Novo Paraíso. Que o diga dona Luzia Sales, 51, há 16 anos vivendo na comunidade. Com uma ferida no pé causada por uma queimadura, dona Luzia vem recebendo os cuidados da equipe de agentes comunitários de saúde, mas não abre mão do uso de ervas, folhas e raízes que ajudam no processo de cicatrização. Ela faz uso do Aranto – uma suculenta que ajuda no tratamento de doenças e machucados. “Ela (a planta) serve pra tudo, quando a pessoa está doente e faz o xarope ou aplica no local do ferimento, ajuda a sarar, atuando como um anti-inflamatório”, explica Luzia, ao receber da vizinha algumas folhas, num movimento simbólico da relação da comunidade com o processo de cura por meio do conhecimento tradicional.

SOBRE OS PARCEIROS

No Brasil, a USAID, a NPI EXPAND e a SITAWI Finanças do Bem se uniram para criar uma parceria para apoiar a Resposta à COVID-19 na Amazônia. Entre 2020 e 2021, a primeira fase do projeto do NPI EXPAND Resposta à COVID-19 na Amazônia distribuiu mais de 23 mil cestas básicas e kits de higiene, capacitou mais de 500 agentes comunitários de saúde, doou mais de 1,4 milhão de máscaras feitas por costureiras locais e divulgou mensagens educativas de prevenção para mais de 875 mil pessoas na região. A Fase 2 está promovendo maior resiliência das comunidades amazônicas através do apoio amplo a vacinação contra a COVID-19, campanhas de informação e combate à fake News, e apoiando os sistemas locais de saúde na região com equipamentos e insumos para detectar, prevenir e controlar a transmissão de Covid-19, bem como realizar o acompanhamento de casos agudos de COVID-19 e tratar as sequelas de síndrome pós-COVID-19