Guia das Parteiras Tradicionais é validado na primeira reunião da nova diretoria da Associação Algodão Roxo

O Instituto Leônidas & Maria Deane (ILMD/Fiocruz Amazônia) e a Associação das Parteiras Tradicionais do Amazonas (APTAM) Algodão Roxo validaram o conteúdo final da nova edição do Guia das Parteiras Tradicionais, durante a primeira reunião da nova diretoria da entidade. O guia deverá ser publicado até o final deste ano, pela Editora Rede Unida, e faz parte das atividades do Projeto Redes Vivas e Práticas Populares de Saúde: Conhecimento Tradicional das Parteiras e a Educação Permanente em Saúde para Fortalecimento da Rede de Atenção à Saúde da Mulher no Estado do Amazonas,  desenvolvido pelo Laboratório de Pesquisa em História e Ciências da Saúde na Amazônia (Lahpsa), da Fiocruz Amazônia, com apoio do Ministério da Saúde, Secretaria de Estado da Saúde (SES-AM), Projeto Inserção das Parteiras tradicionais nas equipes da Atenção Basica no Estado do Amazonas e Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá – IDSM. O projeto é coordenado pelo pesquisador e chefe do Lahpsa, Júlio César Schweikardt.

Com aproximadamente 70 páginas, o guia é um material adaptado à realidade amazônica e poderá ser utilizado pelas próprias parteiras e profissionais da rede de saúde. Ele reúne informações referentes aos procedimentos, direitos e ações das parteiras, com linguagem acessível e o olhar das parteiras sobre conceitos ligados ao corpo da mulher, da gestação ao pós-parto, entre outros aspectos. A publicação foi o resultado do trabalho de uma equipe multiprofissional, composta por pesquisadores do ILMD/Fiocruz Amazônia, alunos de pós-graduação, profissionais de saúde com especialização em atenção à saúde da mulher e as parteiras.

A pesquisadora visitante do ILMD, Lupuna Corrêa de Souza, que participou da elaboração do guia, explica que a ideia de fazer uma nova publicação com as parteiras tradicionais da Amazônia surgiu da necessidade de atualização das informações contidas em outros materiais já existentes, a exemplo do “Livro da Parteira Tradicional”, elaborado pelo Ministério da Saúde em colaboração com o Grupo Curumin, editado em 2000 e atualizado em 2012. “O livro foi utilizado por centenas de parteiras em todo o Brasil, contribuindo de maneira significativa para a atualização do trabalho das parteiras tradicionais, as quais assistem as mais distantes comunidades onde muitas vezes o Estado não chega”, observa a pesquisadora.

Segundo o pesquisador Júlio César Schweickardt, a partir dos anos 2000, o Ministério da Saúde lançou o “Programa Trabalhando com Parteiras Tradicionais”, reconhecendo a importância do trabalho das parteiras nos partos domiciliares, trazendo, com isso, a necessidade de aproximar as parteiras ao trabalho do SUS, especialmente na Atenção Básica. “O Livro das Parteiras, do Ministério da Saúde, reconhece e valoriza o trabalho das parteiras tradicionais e traz de forma simples e acessível na linguagem. O Guia, por sua vez, tem como diferencial o fato de ser construído com 100% de participação das parteiras. Para isso, de outubro de 2016 a abril de 2022 foram realizados 43 eventos (encontros, oficinas de trocas de saberes e reuniões), com a participação de 1.163 pessoas, destas 607 parteiras, 216 profissionais de saúde e 340 outros profissionais”, explica.

Ao todo, o trabalho contemplou parteiras de 20 municípios situados em diferentes regiões do Estado, tendo como traços característicos recortes de áreas de fronteira, reserva extrativista, com populações indígenas, população urbana ou próxima de Manaus, divisa com outros estados, acesso somente por rio e acesso por estrada. Entre os municípios envolvidos, estão Tabatinga, Santo Antônio do Içá; Fonte Boa (Alto Solimões), Tefé e Maraã (Região do Triângulo), Manacapuru e Coari (Rio Negro e Rio Solimões), Manaus, Nova Olinda do Norte, São Gabriel da Cachoeira (entorno e Alto Rio Negro), Itacoatiara e Silves (Médio Amazonas), Parintins e Maués (Baixo Rio Amazonas), Eirunepé e Envira (Rio Juruá), Lábrea e Boca do Acre (Rio Purus) e Humaitá e Borba (Rio Madeira).

ADAPTAÇÕES

A participação das parteiras foi de extrema importância no processo de validação do conteúdo do guia. “Foram incorporadas à publicação imagens com inspirações indígenas, elaboradas por um artista de uma das comunidades trabalhadas. Em relação a linguagem, as parteiras foram consultadas e com elas validados todos os textos, pois o Guia é para elas, sendo justo que a linguagem seja a que elas se reconheçam”, explica Lupuna Souza, lembrando que “nesse item, o saber acadêmico científico vem para fortalecer o saber tradicional, ancestral, que passa de geração em geração”.

A pesquisadora ressalta que, apesar de não ser um guia direcionado às comunidades indígenas, alguns exemplos e inspirações vieram a partir da interação com essas comunidades e por isso, sua representatividade marcante na publicação. “Não estamos aqui, ensinando as parteiras a partejar, o objetivo é auxiliar na atualização das mesmas em relação aos exames que são necessários fazer, aos cuidados e até mesmo em relação às Leis, seja de amparo a parturiente, seja de reconhecimento a própria profissão de parteira. Assim, fortalecendo e melhorando a atuação dessas corajosas e importantes profissionais que muitas vezes são tão invisíveis quanto seus territórios de atuação. Acredito, que além de auxílio profissional, este Guia é uma importante ferramenta para visibilidades dos territórios e de quem atua e cuida dele”, afirmou.

O processo de elaboração do guia contribuiu também para o fortalecimento da organização das parteiras e um passo importante na busca pelo reconhecimento legal da profissão. “Aqui no estado do Amazonas a Lei n°. 4.875, de 16 de julho de 2019, instituiu o Dia Estadual da Parteira no Estado do Amazonas. E a presença da parteira tradicional na hora do parto no Amazonas é assegurada pela Lei n°. 5.312, de 18 de novembro de 2020 que autoriza a presença de parteiras durante todo o período de trabalho de parto, parto e pós-parto imediato, sempre que solicitadas pela parturiente, nas maternidades, casas de parto e estabelecimentos hospitalares congêneres, da rede pública e privada do Estado do Amazonas”, relata a presidente da APTAM, Maria do Perpétuo Socorro da Silva.