Fiocruz Amazônia capacita profissionais do Ministério da Saúde de Angola em técnicas de virologia para melhoria da vigilância entomológica no país africano

Durante uma semana, a Fiocruz Amazônia recebeu a visita de profissionais especialistas do Ministério da Saúde de Angola para a realização de capacitação em técnicas de virologia voltadas ao isolamento e sequenciamento nucleotídico (DNA) de vírus, a partir de insetos transmissores de doenças como dengue, malária, zika, chikungunha, febre amarela, entre outras. O treinamento foi ministrado pela equipe do Núcleo de Vigilância de Vírus Emergentes, Reemergentes ou Negligenciados, do Instituto Leônidas & Maria Deane (ILMD/ Fiocruz Amazônia) e fez parte do Curso Internacional sobre Técnicas de Detecção Molecular de Patógenos em Artrópodes, realizado no Brasil pelo Projeto de Melhoria dos Sistemas de Vigilância Regional (Redisse IV), desenvolvido pelo Governo de Angola, em parceria com a Fiocruz, tendo como objetivo promover a atualização do mapa entomológico daquele país, além de fortalecer o sistema de vigilância de vírus nos países pertencentes à Comunidade Econômica dos Estados da África Central.

A iniciativa, coordenada pelo Centro de Relações Internacionais em Saúde (CRIS), da Fiocruz, visa o aprimoramento das estratégias de detecção e respostas rápidas a surtos de doenças e ameaças à saúde pública. O curso, segundo a bióloga Genimar Rebouças Julião, pesquisadora da Fiocruz Rondônia e coordenadora técnica do projeto, é parte de um trabalho que já vem sendo realizado em parceria, entre os dois países, com foco na formação de recursos humanos, avanço na taxonomia de vetores de Angola e no estabelecimento de cooperação internacional com vistas a colaboração em pesquisas cientificas futuras. A formação oferecida aos profissionais do Ministério da Saúde angolano foi realizada em dois módulos. O primeiro, no Laboratório de Virologia Molecular da Fiocruz Rondônia, entre os dias 7 e 11/07. E o segundo, em Manaus, de 14 a 18/07.

Genimar explica que o Redisse IV é um programa regional que apoia países da África Central no enfrentamento de doenças e epidemias, e, no Brasil, na atual fase do projeto, envolve pesquisadores do Instituto Oswaldo Cruz (IOC), no Rio de Janeiro, do ILMD/Fiocruz Amazônia, em Manaus, e da Fiocruz Rondônia, em Porto Velho. A iniciativa é financiada pelo Banco Mundial e conta também com apoio da Fundação para o Desenvolvimento Científico e Tecnológico em Saúde (Fiotec), da Fiocruz. “O projeto de ampliação do mapa entomológico de Angola vem de uma iniciativa anterior do governo angolano, de 2023, com a finalidade de elaborar uma lista das principais espécies de vetores e mapear onde elas ocorrem. Agora, nós da Fiocruz estamos participando da atualização desse mapeamento, numa prestação de serviço da Fiocruz para o Ministério da Saúde de Angola”, enfatiza a pesquisadora.

O intercâmbio com Angola vem permitindo à Fiocruz realizar também coletas entomológicas em diferentes províncias daquele país, estabelecendo relações de cooperação. Em abril deste ano, um grupo de especialistas da Fiocruz embarcou para Angola a fim de participar de uma missão visando a atualização do mapa entomológico do país africano, necessidade reforçada após o primeiro registro do mosquito “tigre-asiático” (Aedes albopictus) no território angolano em 2025. “O objetivo do trabalho é levantar novos dados sobre a situação epidemiológica das doenças transmitidas por vetores na região. Pretendemos voltar a Angola para um segundo treinamento e formação dos profissionais nas principais técnicas entomológicas, triagem, armazenamento, conservação de amostras entomológicas para transporte e remessa”, observa Genimar. A próxima expedição será em agosto, com a participação de 19 pesquisadores.

Felipe Naveca explica que a cooperação tem como principal objetivo fortalecer o sistema de vigilância de Angola. Chegamos ao final do treinamento e foi uma semana muito proveitosa onde repassamos diversos aspectos relacionadas à vigilância viral, especialmente à vigilância dos arbovírus. Eles tiveram experiencia de executar desde tratativas de isolamento de vírus em cultura de células, depois o preparo do material para o sequenciamento genético e agora as análises do sequenciamento. Passaram por todas as etapas para que possam fazer o mesmo uma vez chegando em Angola, melhorando a sua vigilância para que possam caminhar sozinhos, cada vez identificando possíveis vírus que estejam surgindo”, afirma Naveca..

O curso incluiu técnicas para isolamento viral e efeito citopático, produção de cDNA, PCR convencional, sequenciamento na Plataforma Illumina, Introdução à Bioinformática para análise de genomas virais e ferramentas de bioinformática para montagem de genomas e inferência filogenética.  O biomédico angolano Pedro Afonso faz parte do Instituto Nacional de Investigação em Saúde, laboratório de referência nacional do Ministério da Saúde daquele país. Segundo ele, a experiência da formação foi bastante proveitosa em termos de aprendizado. “Estamos muito agradecidos pela acolhida e pelos conhecimentos repassados na área laboratorial. Aprendemos vários temas, cultura de células, extração, DNA, RNA, sequenciamento de genomas, análise bioinformática. Está sendo uma experiência agradável e que superou as nossas expectativas”, afirmou Pedro, que espera colocar em prática um sistema de vigilância mais robusto e ativo em Angola após a formação.

O biólogo Rafael Dimbu, atua no Programa Nacional de Controle da Malária de Angola e considerou a oportunidade de capacitação um passo decisivo no processo de fortalecimento da vigilância entomológica no país africano. “Viemos ter uma formação   no âmbito de atenção de patógenos e treinamos aspectos como extração do DNA dos artrópodes, PCR em tempo real, amplificação dos genes, e agora dando segmento às áreas relacionadas ao sequenciamento do genoma. Encontramos uma equipe qualificada e que sabe transmitir conhecimento, tanto na Fiocruz em Manaus quanto em Rondônia, e temos outra equipe no Rio de Janeiro, se aperfeiçoando na resistência dos vetores a inseticidas”, detalhou, destacando as semelhanças existentes entre os dois países no controle das doenças. “São dois países tropicais que enfrentam os mesmos fenômenos, sendo o Brasil mais avançado do ponto de vista tecnológico, razão pela qual estamos gratos por essa cooperação”, reforçou.

SOBRE O CURSO

Com carga horária de 40 horas, o Curso Internacional sobre Técnicas de Detecção Molecular de Patógenos em Artrópodes visa apresentar técnicas e metodologias para caracterização molecular dos principais arbovírus circulantes em Angola, treinar a análise de diagnóstico molecular diferencial para outras arboviroses emergentes/reemergentes e/ou negligenciadas; e realizar a caracterização genética e inferência filogeográfica dos agentes virais identificados no estudo. Além de Angola, pertencem à Comunidade Econômica dos Estados da África Central a República Centro-Africana, Chade, República do Congo e República Democrática do Congo.

O objetivo é promover melhorias nos sistemas de saúde e na capacidade diagnóstica, de detecção e de prevenção, que permitam respostas mais rápidas e eficientes às ameaças de Saúde Pública regional e global. O projeto prevê a formação de técnicos angolanos e a criação de capacidade local para garantir a continuidade destes procedimentos em períodos mais curtos. Segundo Genimar Rebouças, o projeto prioriza investimentos em recursos humanos, principalmente os profissionais de “linha de frente”, que executam as ações de vigilância e controle no país. “O fortalecimento da capacidade diagnóstica, com ampliação do acesso a técnicas moleculares para a identificação de patógenos e a caracterização dos vetores envolvidos, é essencial para a detecção precoce e a implementação de medidas de contenção mais eficazes”, confirma Genimar.

ILMD/Fiocruz Amazônia, Por Júlio Pedrosa

Fotos: Júlio Pedrosa