Fiocruz define corredores de tecnologias sociais como um dos marcos da COP 30 e legado da Amazônia para o Mundo
A Fundação Oswaldo Cruz, por meio da Vice-Presidência de Ambiente, Atenção e Promoção à Saúde (VPAAPS) e o Instituto Leônidas & Maria Deane (ILMD/Fiocruz Amazônia), reuniu diversas instituições, em Manaus, no último mês de maio, para definir os Corredores de Tecnologias Sociais em Saúde – conjunto de estratégias de Atenção Básica oferecidas na região – como um dos marcos da Amazônia a serem apresentados na COP 30, em novembro, na cidade de Belém, entre outras propostas para enfrentamento dos desafios decorrentes das mudanças climáticas na região. De acordo com o pesquisador em Saúde Pública da Fiocruz Amazônia, Rodrigo Tobias, as Tecnologias Sociais (TS) emergem como respostas inovadoras e integradas – desenvolvidas de forma colaborativa entre comunidades tradicionais, pesquisadores, e instituições governamentais e não governamentais – para enfrentar problemas estruturais de sustentabilidade, inclusão social e justiça climática.

Entre as Tecnologias Sociais existentes, estão as Unidades Básicas de Saúde Fluviais (UBSF), diretamente relacionadas ao cuidado em saúde nas áreas ribeirinhas. “A Amazônia, maior sociobiodiversidade mundial, é um ecossistema vital que congrega uma multiplicidade de culturas, saberes e práticas ancestrais. Nesse vasto território, enfrentamos desafios decorrentes do desmatamento, da degradação ambiental e das pressões socioeconômicas que ameaçam tanto o equilíbrio ecológico quanto a identidade dos povos que ali vivem”, observa o pesquisador, destacando, nesse cenário, as Tecnologias Sociais (TS) das UBSF como um arranjo tecno-assistencial que produz tecnologias relacionais de cuidado em saúde nas áreas ribeirinhas.
Além dos Corredores de Tecnologias Sociais, de Manaus/Santarém/Belém, a Fiocruz apresentará também o Centro de Pesquisa em Saúde e Clima, a ser instalado na sede da Fiocruz Rondônia, em Porto Velho, e o Centro de Síntese em Saúde para Mudança do Clima, Biodiversidade e Poluição, no Rio de Janeiro, que funcionará como um elo entre a produção científica e a formulação de políticas públicas brasileiras, com inovações metodológicas, reforçando a resposta brasileira frente à crise ambiental e seus impactos na saúde pública.

ATIVO ESTRATÉGICO
De acordo com Rodrigo Tobias, a iniciativa de criação do corredor de tecnologias sociais em saúde busca, primeiramente, reconhecer e valorizar as práticas inovadoras que já estão em curso na região, transformando o conhecimento local em um ativo estratégico para a construção de um futuro sustentável. “O Corredor(rios) visa estabelecer uma ponte entre as realidades locais e as demandas globais, promovendo a integração das TS na agenda da COP 30 e conectando-as aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e à justiça climática”, explica Tobias, citando essa articulação como fundamental para que políticas públicas passem a contemplar as especificidades e os desafios da Amazônia.
“O termo Corredor(rios), inserido nesta proposta, faz justiça a metáfora dos rios e que requer deflexão dos sentidos e tentativa de constituir sentido e significado dos rios como fluxo/movimento, caminho/viagem, correnteza/adaptação, integração/conexão, ritmo e ciclo natural como condição de revelar as tecnologias sociais em diversos lugares da Amazônia. O termo transmite a ideia de movimento constante, dinamismo e transição. Essa metáfora reforça o conceito de que as Tecnologias Sociais são processos em constante evolução e circulação, capazes de transformar realidades por meio do fluxo de conhecimentos e práticas do interesse público e da COP 30”, esclarece o pesquisador.

ENTRELAÇAMENTO
Para o coordenador de Saúde e Ambiente da VPAAPPS, Guilherme Franco Neto, presente ao encontro em Manaus, a estratégia marca a consolidação do enlace entre o trabalho realizado no Delta do Tapajós, pela ONG Saúde e Alegria e a Fiocruz. “Esse momento tem um significado importante porque começamos a fazer os enlaces em torno das relações do trabalho no Delta do Tapajós, o que gerou uma oficina de trabalho que realizamos aqui, na Fiocruz Amazônia, em maio de 2024, como um primeiro momento de um contato mais orgânico da Vice-Presidência com todos os pesquisadores e a direção do instituto e, obviamente, nossa relação com o Projeto Saúde e Alegria”, explica Guilherme, ressaltando a importância do Projeto Diagnóstico Situacional das UBS Fluviais na Amazônia e Pantanal, desenvolvido pela Fiocruz, com apoio do Ministério da Saúde, um resultado desse entrelaçamento.

“Estamos hoje fazendo um balanço de como se encontra o diagnóstico das UBS Fluviais na Amazônia como um todo e vamos entrar numa segunda fase do projeto a partir do reconhecimento do Ministério da Saúde do nosso trabalho e da formalização de uma cooperação com a Fiocruz. Além da implementação da 2ª fase do projeto, estamos fazendo também um debate importante envolvendo o terceiro setor, no contexto da COP 30, para que construamos um caminho virtuoso para expressar as tecnologias sociais que têm relação estreita entre clima e saúde, tanto para a COP 30 quanto para a Cúpula da Terra”, afirmou o coordenador de Saúde e Ambiente da VPAAPS.

Rodrigo Tobias, coordenador geral da 2ª fase do projeto Diagnóstico Situacional das UBS Fluviais, explica que a intenção é fazer do corredor de tecnologias sociais uma vitrine de experiências exitosas e espaço de diálogo e aprendizado coletivo, capaz de impulsionar a transformação socioambiental e influenciar decisões em âmbito global durante a COP 30. “São pilares da estrutura das tecnologias sociais na Amazônia a justiça social, conhecimento tradicional, sustentabilidade ambiental e colaboração comunitária”, reforça Tobias. Segundo ele, a proposta será realizar eventos com essa temática seguindo o fluxo dos rios até a COP 30, em Belém. “Tal expedição de levantamento de tecnologias sociais pelos rios amazônicos visa proporcionar a integração das práticas, projetos locais e visibilidade para iniciativas comunitárias de forma a inspirar políticas públicas e oferecer soluções concretas para os desaio globais no território amazônico”, confirma Tobias.

Presente ao encontro, o presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), Rômulo Paes de Souza, aprovou a iniciativa e ressaltou que a estratégia integra a Amazônia ao conhecimento global sobre como lidar com os desafios do planeta. “A Abrasco visita Manaus para se integrar nessa iniciativa da Fiocruz e de outras instituições que têm uma participação efetiva na produção de ciência na Amazônia e, também, fora. A Amazônia tem seus próprios desafios, mas também tem um ensinamento muito grande a oferecer para todas as gerações que estão vivendo esses grandes momentos de desafios climáticos, sociais e políticos. Recuperemos isso a partir dessa tradição das expedições e conhecimento construídos através do caminho das águas. A Abrasco deseja participar dessa iniciativa”, destacou.

O médico sanitarista Eugênio Scannavino Netto, um dos fundadores da ONG Projeto Saúde e Alegria, de Santarém (PA), responsável pela implementação do modelo de atendimento itinerante em saúde que originou a Estratégia de Saúde Fluvial, que financia hoje o funcionamento das UBS Fluviais, ressaltou a importância das tecnologias sociais na Amazônia como marco da COP 30. “Estamos aqui no sentido de pensar corredores de tecnologias sociais na Amazônia. Sabemos que existem muitas propostas, muitas tecnologias fragmentadas, e que, se aplicadas em larga escala, poderiam ser adotadas como soluções não só para a Amazônia. A intenção é trazer à discussão, fazer um corredor onde as pessoas possam visitar soluções práticas”, observou. A pesquisa Diagnóstico Situacional das UBS Fluviais na Amazônia e Pantanal é desenvolvida pelos parceiros ONG Projeto Saúde e Alegria, Universidade Federal do Pará (UFPA) e Instituto de Estudos Para Políticas de Saúde (IEPS). O encontro contou também com a presença de representante do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA).
ILMD/Fiocruz Amazônia, Por Júlio Pedrosa
Fotos: Júlio Pedrosa