Presidente da SBPC concede entrevista à Fiocruz Amazônia

Em entrevista à Fiocruz Amazônia Revista, Ildeu Moreira de Castro, presidente da SBPC, falou sobre a redução e contingenciamentos de recursos que atingem a área de Ciência, Tecnologia e Inovação. O gestor falou ainda sobre o papel da ciência, sobre questões da Amazônia e as estratégias da entidade para fortalecer a Divulgação Científica no Brasil.

CONFIRA A ENTREVISTA:

Professor e pesquisador do Instituto de Física da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Ildeu Moreira de Castro assumiu em julho de 2017 mais um desafio importante em sua extensa carreira: comandar a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).

A entidade foi criada em 1948 e se dedica ao avanço científico, tecnológico, do desenvolvimento educacional e cultural do País, agregando 127 sociedades científicas associadas de todas as áreas do conhecimento. Em entrevista exclusiva à Fiocruz Amazônia Revista, Ildeu falou sobre a trajetória de sete décadas da SBPC e os principais desafios que a comunidade científica enfrenta.

Nesse sentido, ele manifestou preocupação com a redução e contingenciamentos de recursos que atingem a área de Ciência, Tecnologia e Inovação. “O corte atinge a sociedade em vários aspectos. Primeiro, porque hoje a ciência e tecnologia é cada vez mais um elemento fundamental para as nações”, pontuou.

O gestor falou também sobre os seminários temáticos promovidos por todo o País com assuntos voltados para o desenvolvimento social, educacional e científico. Tratou ainda do papel da ciência sobre questões da Amazônia e as estratégias da entidade para fortalecer a Divulgação Científica no País.

Fiocruz Amazônia Revista – A SBPC completou 70 anos, em 2018. Foram muitos desafios, dificuldades e também conquistas e vitórias em prol da ciência e da sociedade. Como o senhor avalia a atuação da instituição para o avanço das discussões e políticas científicas no País e, sobretudo, quais as perspectivas para o futuro considerando a crise política e institucional que enfrentamos?

Ildeu Castro – Em primeiro lugar, a SBPC tem sete décadas de atuação muito intensa na ciência, na educação e na democracia do País e essa história, de certa maneira, é paralela ao crescimento da ciência brasileira nas últimas décadas. A entidade, desde seu início, batalhou muito pela criação das instituições de pesquisa e das agências de fomento e ainda na sua criação ela estava batalhando pela continuidade das pesquisas de São Paulo.

Ela já nasceu sob esse simbolismo pela ciência brasileira. Logo no início participou da luta pela criação do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), de Anísio Teixeira, grande criador da Capes que foi presidente da SBPC.

Atualmente, estamos vivendo um momento de resistência, de desmonte, portanto muito difícil do ponto de vista de uma política que não valoriza a ciência e tecnologia e tem reduzido muito os recursos para o investimento, atingindo profundamente agências fundamentais como o CNPq, a Capes, a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), as agências de inovação. Por isso temos feito inúmeras manifestações junto ao governo, junto ao Congresso Nacional, fizemos abaixo assinado, Marcha pela Ciência, para colocar isso para a população. Fomos ao Congresso Nacional várias vezes.

Nesses últimos anos, passamos a ter atuação ativa no Legislativo, acompanhamos projetos de lei. A entidade tem se posicionado em várias situações junto ao Legislativo. O segundo ponto é essa questão dos recursos que foram diminuídos drasticamente, temos discutido com os presidenciáveis, alguns deles já se comprometeram com esses pontos e estamos insistindo com outros, inclusive deputados e senadores para que haja uma reversão de redução drástica para ciência e tecnologia.

Vínhamos numa ascensão de 2013, depois começou cair de uma maneira muito abrupta. De fundo temos uma bandeira da SBPC de mais de 20 anos que é 2% no mínimo do PIB para Pesquisa & Desenvolvimento. Na Europa já está chegando em 3% em média, a Coréia está nos 4%, China nos 3%, Estados Unidos e Alemanha também. E no Brasil está patinando no 1% há muitos anos então a gente está insistindo que essa é uma meta importante para os próximos governos e isso significa envolver muito mais a iniciativa privada em recurso para P&D, como acontece em outros países do mundo.

No Brasil, não, pois é o recurso público que arca fundamentalmente com boa parte dos gastos com ciência, inovação pesquisa e desenvolvimento. Esse é um desafio. O terceiro é a questão da burocracia, vivemos num país com burocracia excessiva, regras demais, os gestores, pesquisadores são considerados culpados, a priori, parece que você é culpado, então você tem que provar que não é. Enquanto que no mundo inteiro, como exemplo a Coréia e China, que estão crescendo rapidamente isso não acontece. Também outros países, como Alemanha, França, EUA, Inglaterra, que tem uma condição mais livre de ciência, de troca, de compra de equipamentos, muito menos restrições o comportamento em relação aos pesquisadores é diferente do Brasil.

A falta de ambiente para desenvolver empresas inovadoras no país é um problema e a burocracia é evidentemente um entrave muito grande, a educação básica de qualidade, formação de técnicos, pessoal qualificado é outro problema, já mencionei inclusive, então, esses são desafios. Talvez um desafio maior é a falta no país de um projeto que faça com que a comunidade científica trabalhe em um nicho, claro que a ciência é importante, que ela tem liberdade e pesquisa em várias áreas, mas compete ao estado definir linhas mobilizadoras prioritárias para alocar recursos de ciência e tecnologia.

Todos os países do mundo fazem isso, colocam prioridades, fazem planos. EUA, China fazem planos décadas a frente. Poderia te elencar meia dúzia de desafios pela frente. Um deles é melhorar a educação pública do Brasil, a educação básica e em particular a educação científica. Tem uma proposta sendo discutida no CNE (Conselho Nacional de Educação) de Base Comum Curricular que é muito deficiente do ponto de vista da ciência.

Então nós estamos lá, discutindo, criticando, brigando para que jovens tenham acesso a ciência de uma maneira interessante, temos que melhorar muito a educação que está muito ruim em relação ao ensino médio, na educação científica que não pode fazer de uma maneira apressada que joga fora a criança do colo da mãe, é o desenho que está colocado lá, então esse é um desafio muito grande: melhorar a educação básica brasileira, isso é importante para a ciência para a tecnologia e para o país como um todo.

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Fiocruz Amazônia Revista, por Cristiane Barbosa
Foto: Divulgação.