Mostra Navegando pelo Rio Saúde e Bem Viver encerra projeto que visa o cuidado com a saúde mental na Atenção Primária no Amazonas
Experiências de práticas integrativas que promovem o cuidado em saúde mental e física de profissionais e usuários do sistema de saúde marcaram nesta segunda-feira, 20/10, o primeiro dia da Mostra Navegando pelo Rio Saúde e Bem-Viver, realizada na sede do Conselho de Secretarias Municipais do Amazonas (Cosems-AM), em Manaus. A mostra é a parte final de uma formação do Curso Saúde e Bem Viver: Cuidar de si e do Território, realizado pelo Instituto Leônidas e Maria Deane (ILMD/Fiocruz Amazônia), sob fomento do Observatório Nacional de Saberes e Práticas Tradicionais, Integrativas e Complementares em Saúde (ObservaPICS) e da Vice-Presidência de Ambiente, Promoção e Atenção à Saúde da Fundação Oswaldo Cruz (VPAAPS/Fiocruz).

A apresentação dos projetos de intervenção pelos estudantes equipes do curso encerra um ciclo de formação em serviço da primeira edição do projeto, implantado inicialmente em dez municípios do Estado do Amazonas, num período de aproximadamente seis meses. A mostra, em seu primeiro dia, contou com a presença da coordenadora nacional do ObservaPICS, a pesquisadora da Fiocruz Pernambuco, Islândia Carvalho, que veio a Manaus conhecer de perto algumas das experiências. No Amazonas, o Saúde e Bem Viver tem o apoio da Secretaria de Estado da Saúde (SES-AM), por meio da Coordenação Geral de Políticas Estratégicas em Saúde e da Coordenação Estadual dos Núcleos de Educação Permanente em Saúde e Humanização, e do Cosems-AM.
De acordo com o pesquisador da Fiocruz Amazônia Rodrigo Tobias, coordenador estadual do projeto, no Amazonas, o objetivo da mostra é marcar um momento especial da formação de profissionais de saúde do Estado dentro da política de educação permanente em saúde da Fiocruz com enfoque na saúde mental daqueles que cuidam da saúde da população, a partir de intervenções pensadas e executadas pelas próprias equipes de saúde.

“Hoje é um dia muito importante, porque estamos finalizando a primeira edição do curso Saúde e Bem Viver, que faz parte de um projeto maior que abrange 17 estados do País, entre os quais o Amazonas, que, por meio da adesão de dez municípios, conseguiu formar 270 profissionais de saúde, nesta perspectiva da produção do cuidado baseado nos afetos”, comenta Tobias, entendendo o trabalho sobretudo como um processo de troca e de ressignificação dos trabalhadores da Atenção Primária à Saúde.
“Ficamos muito felizes por estarmos construindo, enquanto Fiocruz Amazônia, ferramentas possíveis de promoção da autonomia e ‘bem ser’ das pessoas que fazem o cotidiano dos serviços de saúde no interior do Amazonas. E esse curso promove o cuidado do “nós” com intervenção favorável no território das vidas daqueles que fazem o território da Atenção Primária”, complementou.

DESDOBRAMENTOS
Islândia Carvalho destacou a importância do apoio da Fiocruz Amazônia para a execução do projeto no Amazonas. “É uma alegria muito grande estar em Manaus hoje porque comemoramos o que foi um curso que trouxe desdobramentos para o território. Ter o apoio da Fiocruz Amazônia foi extremamente importante porque sem a instituição não conseguiríamos chegar até aqui. O ObservaPICS está hoje comemorando o cumprimento de um desafio: desenvolver, sem evasão, um curso à distância com dez municípios do Estado e hoje ter o Amazonas entre os 17 estados do Brasil que já desenvolveram a iniciativa”, ressalta a coordenadora, apontando o cuidado integral e o afeto na Atenção Primária como os alicerces do projeto.

A apresentação das intervenções foi dividida em dois dias. Na manhã da segunda-feira, 20/10, a mostra foi feita presencialmente com os representantes de municípios que aderiram ao projeto. Um dos projetos apresentados foi o Saúde e Conexão, desenvolvido pela equipe multiprofissional da Unidade Básica de Saúde Josias de Lemos, do município do Careiro Castanho, a 112 quilômetros de Manaus. Apresentado pela médica Karina Sebastiana Macedo, o projeto fez a equipe entender que os profissionais de saúde também precisam de cuidados.
“O curso permitiu nos qualificar para uma melhor consciência pessoal e profissional, uma vez que precisamos de cuidados para que possa influenciar o atendimento na ponta, levando para a aplicabilidade no nosso território”, afirma Karina. Entre as práticas integrativas adotadas pela equipe, a musicoterapia, a aromaterapia e a meditação guiada fizeram a diferença na rotina dos trabalhadores. “A música é de fácil acesso, qualquer pessoa tem celular e pode colocar uma música para acalmar os níveis de cortisol e promover o relaxamento. A aromaterapia promove o estímulo que vem dos cheiros, como hortelã e laranja, que acalmam e também diminuem o nível de cortisol. Já a meditação guiada, mais difícil, permite à pessoa se autoconhecer”, relatou.

Para a médica, o projeto permitiu aos profissionais abrirem a mente para outras técnicas além daquelas que adotadas na medicina. “Conseguimos uma equipe mais unida, uma parceria maior, um cuidado mais humano, entendendo que o profissional num determinado dia que pode não estar bem, mas sabe que ao chegar na unidade vai conseguir relaxar, para poder trabalhar da melhor forma possível”, enfatizou.
Outro projeto de intervenção, apresentado pelo enfermeiro Jairo Liima, da Estratégia de Saúde da Família Ribeirinha, do município de Barreirinha, a 330 quilômetros de Manaus, tem como foco a saúde do homem e o combate ao preconceito e aos estigmas. “Implementamos uma dinâmica integrativa de buscar estabelecer contato com os homens durante as partidas de futebol, muito frequentes no município. Sabemos que é difícil o homem procurar um serviço sem ter um problema de saúde instalado. Decidimos então ir para o campo de futebol e lá tivemos a melhor receptividade”, conta Jairo. Hoje, o projeto envolve cerca de 50 homens, que além de jogar futebol, praticam outras atividades físicas e já procuram a unidade para cuidar da saúde de forma preventiva.

PERSPECTIVAS
De acordo com Islândia, esta primeira edição do Saúde e Bem Viver se encerra com a perspectiva futura de ampliação do projeto. “A ideia é ampliarmos a iniciativa para mais municípios no Amazonas, na perspectiva da retomada dos cuidados em saúde, a partir de práticas não biomédicas, unindo com as medicinas indígenas e como possibilitar o diálogo com esse campo”, explicou. Para ela, os projetos de intervenção no território amazônico permitem diversos desdobramentos. “Mapeamos todos os projetos que ficarão disponíveis numa nuvem à qual todos os municípios participantes no País vão ter acesso e poderão ver a capilaridade e conhecer as ideias de cada território”, adiantou. Há também a perspectiva de ampliação a partir do fortalecimento das escolas de saúde pública, com apoio do Ministério da Saúde.

Uma das responsáveis técnicas do projeto, que atuou como articuladora territorial, Livia Lima, acredita na possibilidade de ampliação do projeto para que mais municípios do Amazonas sejam contemplados. “Estamos encerrando o curso Saúde e Bem Viver na esperança de que mais municípios sejam contemplados para que possam fazer esse curso que pensa em dar um conforto, um acolhimento e um cuidado melhor para os trabalhadores”. Representando a secretária de Estado da Saúde, Nayara Maksoud, a coordenadora geral de Políticas Estratégicas em Saúde, Vitoria Regia Marinheiro, participou da abertura da mostra, juntamente com o vice-diretor de Educação, Informação e Comuniação da Fiocruz Amazônia, Cláudio Peixoto, e o secretário executivo do Cosems-AM, Claudio Pontes. Ao todo, 10 municípios amazonenses foram contemplados pelo Saúde e Bem Viver – Careiro Castanho, Barreirinha, Eirunepé, Iranduba, Lábrea, Silves, Urucurituba, Novo Airão, Tabatinga e Tefé.
SOBRE O PROJETO
O Projeto Saúde e Bem Viver: Cuidar de si e do Território é voltado para a promoção do cuidado e formação de equipes multidisciplinares (e-Multi) e/ou equipes de saúde da família (eSF), da Atenção Primária à Saúde, com foco na saúde mental. A finalidade é ampliar e qualificar a atenção à saúde aos usuários e trabalhadores por meio de tecnologias de cuidado integral. Participam do projeto municípios com 70 mil habitantes em estados brasileiros que adotem Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS). No Amazonas, as formações tiveram início em abril deste ano. O projeto de formação em serviço de 120 horas é coordenado pelo Instituto Aggeu Magalhães/Fiocruz Pernambuco, responsável pela criação e coordenação do Observatório Nacional de Saberes e Práticas Tradicionais, Integrativas e Complementares em Saúde – ObservaPICS, da Fiocruz.

No Amazonas, aproximadamente 300 profissionais de saúde de nível médio e superior se matricularam no projeto sob coordenação do ILMD/Fiocruz Amazônia, em parceria com a Secretaria de Estado da Saúde (SES-AM). Ao final, será possível realizar um diagnóstico abrangente das ações e intervenções de cuidado integral na promoção à saúde mental. O projeto é uma iniciativa do Núcleo de Gestão da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no SUS do Departamento de Gestão do Cuidado Integral da Secretaria de Atenção Primária à Saúde do Ministério da Saúde (NTG-PNPIC/DGCI/SAPS/MS), coordenado pelo ObservaPICS.
SOBRE AS PICS
As Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS) são abordagens terapêuticas que visam a promoção, prevenção e recuperação da saúde, utilizando recursos que complementam o tratamento convencional. São práticas que enfatizam a escuta acolhedora, a construção de laços terapêuticos e a conexão entre o indivíduo, o meio ambiente e a sociedade. As PICS buscam a prevenção de doenças e a promoção da saúde, utilizando conhecimentos tradicionais e abordagens integrativas, baseadas em uma visão holística do ser humano, considerando a interconexão entre corpo, mente, espírito e ambiente.
São exemplos de PICS: acupuntura, yoga, meditação, fitoterapia, homeopatia, biodança, aromaterapia, arteterapia, ayurveda, entre outros. No total, 29 práticas e terapias são reconhecidas pelo SUS, tendo como benefícios prevenção e tratamento complementar de doenças crônicas – como hipertensão, diabetes, fibromialgia e depressão –, redução do estresse e da ansiedade, melhoria da qualidade de vida com a promoção do bem-estar físico, mental e emocional, fortalecimento do vínculo terapêutico, com a escuta acolhedora e a construção de laços entre o paciente e o profissional de saúde.
OBSERVAPICS
O Observatório Nacional de Saberes e Práticas Tradicionais, Integrativas e Complementares em Saúde (ObservaPICS) está vinculado à Vice-Presidência de Ambiente, Promoção e Atenção à Saúde da Fundação Oswaldo Cruz (VPAAPS/Fiocruz). Tem como objetivo gerar evidências científicas, a partir das evidências práticas acerca dos saberes tradicionais e práticas integrativas no Sistema Único de Saúde (SUS), para contribuir para a tomada de decisão, no campo das políticas públicas, tanto no Brasil quanto na América Latina.
O ObservaPICS tem como missão promover a reflexão teórico-conceitual e observar, com mapeamento e análise crítica o conhecimento e modos de cuidar da saúde preservados por povos tradicionais, como indígenas e comunidades afrobrasileiras, e o diálogo dessas experiências com o SUS, bem como as 29 Práticas Integrativas e Complementares em Saúde reconhecidas pelo Ministério da Saúde no Brasil, sua validação e interação com o modelo biomédico predominante.
Para desenvolver suas atividades, o ObervaPICS conta com apoiadores técnicos (bolsistas) e pesquisadores colaboradores de diferentes unidades da Fiocruz e de instituições parceiras. A pesquisadora da Fiocruz Pernambuco, Dra. Islândia Sousa, coordenadora nacional da iniciativa e do ObservaPICS, afirma que “a formação Saúde e Bem Viver nasce da realidade dos territórios do SUS e promove o cuidado com quem cuida”.
ILMD/Fiocruz Amazônia, Por Júlio Pedrosa
Fotos: Júlio Pedrosa