Fiocruz fortalece a disseminação das primeiras capacitações em vigilância e monitoramento da exposição mercurial em populações indígenas no Brasil
A Fiocruz Amazônia está coordenando o processo de discussão e elaboração do projeto pedagógico que visa a operacionalização do curso de capacitação profissional em vigilância e monitoramento da exposição mercurial em populações indígenas do Amazonas, Rondônia e Mato Grosso, a ser oferecido para profissionais de saúde com nível superior, nos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI) Porto Velho e Vilhena, em março de 2026. A experiência teve início em setembro de 2025, com uma série de reuniões presenciais em Rondônia, as quais visavam consolidar o projeto, bem como programar e fechar a metodologia de oficina pedagógica que ocorreu entre os últimos dias 13 e 15/10, em Porto Velho-RO. A oficina teve como objetivo iniciar a construção interdisciplinar do plano de ensino, da matriz de conteúdo e do material didático que será usado nos dois cursos.
O pesquisador em Saúde Pública e epidemiologista da Fiocruz Amazônia Jesem Orellana coordenou a oficina pedagógica, realizada nas dependências do Centro de Estudos em Saúde do Índio de Rondônia (CESIR) da Universidade Federal de Rondônia (UNIR) e da Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé, ambas em Porto Velho-RO. “A iniciativa de criação do curso é inédita e visa aperfeiçoar o atendimento em saúde aos povos indígenas do Sudoeste da Amazônia Ocidental”, explica Jesem Orellana.
Segundo ele, o curso dará uma importante contribuição à exploração do tema na região. “Trata-se de pauta pouco valorizada ou inexistente no processo formativo de trabalhadores de saúde, não apenas na região Amazônica, mas no Brasil como um todo, pois o uso indiscriminado do mercúrio, há pelo menos 40 anos, em garimpos ilegais, acarreta não apenas na destruição e contaminação dos nossos solos e águas, como também gera uma variedade de efeitos negativos à saúde humana, deixando populações historicamente vulneráveis como os indígenas da Amazônia Legal, em risco ou ameaça ainda maior”, afirma o pesquisador.

A oficina iniciou com uma imersão individual na temática envolvendo exposição mercurial e suas consequências no bioma amazônico, com enfoque em seus aspectos conceituais, técnicos e pedagógicos. Na sequência, o professor doutor da UNIR e pesquisador do Laboratório BioGeoQuímica Ambiental Wolfgang C. Pfeiffer. Ronaldo de Almeida, proferiu palestra sobre o tema “Exposição humana ao mercúrio na Amazônia: impactos nos ecossistemas e antecedentes históricos”, seguida de discussão com os membros da equipe técnica do projeto.
No segundo dia, a oficina iniciou com uma reunião ampliada entre a equipe técnica do projeto, formada por trabalhadores de saúde e pessoal da área de educação, com as colaboradoras dos DSEI Porto Velho e Vilhena, no intuito de adaptar e aperfeiçoar a proposta de curso envolvendo exposição mercurial e suas consequências sobre a saúde humana, a partir de um processo de escuta ativa. Jesem Orellana explica que este processo de escuta ativa provou seu potencial para subsidiar uma proposta técnica e pedagógica de curso mais próxima à realidade e demandas locais, pois lançou luzes sobre detalhes do cotidiano de indígenas, como hábitos alimentares e outros aspectos culturais, assim como de particularidades do território ou mesmo da operacionalização da atenção à saúde indígena nos DSEI Porto Velho e Vilhena, responsáveis por cuidados junto a indígenas dos estados do Amazonas, Rondônia e Mato Grosso. Em seguida, ocorreu uma reunião da equipe técnica para discussão da temática envolvendo exposição mercurial e suas consequências sobre a saúde humana, bem como uma primeira discussão do conteúdo a ser abordado no curso, voltado para profissionais de saúde como enfermeiros, médicos, odontólogos, nutricionistas e biólogos, focando na realidade das áreas sob responsabilidade dos DSEI de Porto Velho e Vilhena.
No último dia, a oficina foi inicialmente coordenada pelo professor doutor Aly David Arturo Yamall Orellana, do Museu das Culturas Indígenas (MCI), de São Paulo, com a segunda reunião ampliada entre a equipe técnica do projeto e as colaboradoras dos DSEI Porto Velho e Vilhena. A oficina foi finalizada com o encerramento no turno vespertino, no intuito de consolidar as bases da primeira proposta de curso sobre as ameaças e riscos associadas à exposição mercurial de indígenas nos cobertos pelos DSEI Porto Velho e Vilhena. Jesem Orellana avalia como extremamente positiva a discussão. “É o início de um diálogo participativo histórico sobre o tema, entre academia e serviço, na medida em que se trata de um velho e negligenciado problema, dentro e fora das terras indígenas. Quem sabe esta iniciativa não é a semente para a tão sonhada implementação de protocolos à vigilância e monitoramento da exposição mercurial no segmento materno-infantil indígena”, pontuou.
AUDIENCIA DO MPF
Jesem Orellana participou recentemente de audiência pública promovida pelo Ministério Público Federal (MPF) sobre os Impactos socioambientais do garimpo ilegal no Estado do Amazonas. Na oportunidade, o pesquisador palestrou com a temática “Consequências negativas do garimpo ilegal sobre o meio ambiente e na saúde humana: enfoque em populações amazônidas”, em atividade que envolveu não apenas o Procurador da República André Luiz Porreca Ferreira Cunha do MPF, como também o Prefeito de Humaitá-AM, José Cidenei Lobo do Nascimento, populares, representantes da atividade garimpeira no Rio Madeira, bem como outros representantes da sociedade civil organizada.
ILMD/Fiocruz Amazônia, por Júlio Pedrosa
Fotos: Divulgação / Fiocruz Amazônia