Parteiras indígenas participam de oficina promovida pela Fiocruz Amazônia e Disei Manaus

Um grupo de 28 parteiras tradicionais indígenas dos municípios de Beruri, Autazes, Urucará, Itacoatiara e entorno de Manaus participa a partir desta segunda-feira, 21/2, da oficina “Troca de Saberes com Parteiras Tradicionais Indígenas”. O objetivo do evento, realizado pela Fiocruz Amazônia e o Distrito Sanitário Especial de Saúde Indígena (Disei) Manaus, é promover um intercâmbio de experiências entre mulheres indígenas parteiras e profissionais de saúde que atuam na rede de atenção à mulher nesses municípios, bem como fortalecer essa prática milenar. O encontro terá dois dias de duração na comunidade Três Unidos, território da etnia kambeba, pertencente ao polo-base Nossa Senhora da Saúde, área de abrangência do Disei Manaus.

A oficina é a penúltima a ser realizada pelo projeto Redes Vivas e Práticas Populares de Saúde: Conhecimento Tradicional das Parteiras e a Educação Permanente em Saúde para o Fortalecimento da Rede de Atenção à Saúde à Mulher no Estado do Amazonas, executado desde 2017 pelo Laboratório de Pesquisa em História e Ciências da Saúde na Amazônia (Lahpsa), do ILMD/ Fiocruz Amazônia, em parceria com o Departamento de Atenção Básica da Secretaria de Estado da Saúde (SES-AM), contando com financiamento do Ministério da Saúde.

Elionai de Figueiredo Soares, enfermeira do Disei Manaus e organizadora da oficina, explica que em alguns casos, como o do povo kambeba, as parteiras são procuradas pelas mulheres primeiro que os profissionais da rede de atenção básica. “Já temos esse reconhecimento lá mas em muitos locais ainda existe resistência por parte dos profissionais de saúde”, afirma. Em Beruri, antes de procurar o serviço para dar início ao pré-natal, as mulheres indígenas são acolhidas e recebem orientação das parteiras da comunidade. Só em seguida é que buscam a equipe multidisciplinar de saúde.

“A parteira é uma pessoa que já está na comunidade, conhece o histórico da paciente e muitas das vezes é da família, sendo, portanto, esse primeiro contato bem melhor que com o profissional de saúde, que é um desconhecido”, observa. Segundo a enfermeira, o objetivo da oficina é permitir que, a partir da troca de saberes, os profissionais entendam a importância das parteiras no contexto de atendimento à saúde da mulher. Durante os dois dias de oficina, enfermeiros e psicólogos que compõem as equipes multidisciplinares de atenção básica estarão participando de atividades em conjunto com as parteiras. No total, 64 parteiras tradicionais estão em atuação nos 19 municípios que integram o Disei Manaus.   

NÚMERO DESCONHECIDO

De 2017 até agora, foram realizadas mais de 30 oficinas em todo o Estado, dentro do projeto financiado pelo Ministério da Saúde. De acordo com a SES/AM, existem no Amazonas 1.400 parteiras cadastradas pelo governo do Estado. A partir das vivências do projeto, explica a gerente de Políticas Estratégicas da SES-AM, Sandra Cavalcanti, foi possível verificar que esse número era muito maior ainda e introduzimos as parteiras tradicionais indígenas nas atividades. “Ainda tem muitas parteiras atuando em lugares distantes onde as equipes não podem estar. Infelizmente, temos um numero cada vez maior de parteiras idosas que não podem mais se deslocar e um dos nossos desafios é incentivar o repasse de conhecimentos entre as gerações de filhas, noras e netas para que a tradição se mantenha viva”, salienta.

Uma das participantes da oficina, Maria Francisca da Silva Queiroz, 43, da etnia apurinã, tem o sonho de poder trabalhar como parteira na sua comunidade. “Não sou parteira ainda, apenas acompanho o trabalho de outras mulheres da minha comunidade e pretendo ser uma parteira”, diz ela, que reside na comunidade São Francisco do Sá Viana, município de Beruri.

AVANÇOS

De acordo com o chefe do Lahpsa, o pesquisador da Fiocruz Amazônia Julio Schweickardt, desde o início da execução do projeto até agora, ocorreram avanços significativos na luta em favor da inserção das parteiras no trabalho de atendimento às parturientes junto às unidades de saúde do Estado. Além de um livro e um documentário sobre o perfil das parteiras tradicionais em atuação no Amazonas, foi criada a primeira associação com a finalidade de organizar o segmento. Duas leis estaduais foram aprovadas pela Assembleia Legislativa do Estado do Amazonas (Aleam) – a primeira instituindo o 5 de maio como Dia Estadual das Parteiras e a segunda, autorizando a presença de parteiras durante todo o trabalho de parto e pós parto sempre que solicitada pela parturiente (antes da lei, as parteiras eram impedidas de ter acesso às unidades).

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ILMD/Fiocruz Amazônia

Fotos – Ingrid Anne / ILMD/Fiocruz Amazônia